segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

escavações contra dor de cabeça...

Meu pai viveu até 85 anos. Gabava-se, nunca tive uma dor de cabeça, não sei o que é isso. No geral, ele era um homem comum. Massss.... lembro-me, desde criança, ter testemunhado um hábito que o acompanhou. Sempre. Uma espécie de meditação diária: escavações.    

Ao meio dia, de segunda a sexta feira, ele chegava, cansado, do trabalho, para almoçar. Depois do almoço, sala de visitas, sozinho. Ali, que também era a sala dos livros discos e radiola, escolhia um LP – Nelson Gonçalves, quase sempre –, colocava para tocar. A sesta seguia pela trilha sonora da seresta. Era a hora.

Sentado no sofá, recostava a cabeça pra trás e começava uma prática milenar entre os humanos: dedo indicador dentro do nariz. Escavava. Escavava e descartava a maioria. Até que... UMA PEPITA! Segurava-a entre os dedos,  e um esboço de sorriso acompanhava o gesto lento meditativo e inconfundível: polegar e indicador circulando um sobre o outro, arredondando... arredondando...

A música, a sesta e as escavações chegavam ao fim quando soavam as duas badaladas do relógio. Meu pai guardava o tesouro no bolso. Indicador e polegar agora apertavam suavemente as narinas, por fora. Tranquilo e descansado, levantava-se e saía – de volta para o trabalho.


Nada pode ser afirmado como conclusão. Só posso dizer que pratico esta forma milenar de meditar, e dor de cabeça tive poucas até hoje. Alguém mais tem algo a dizer sobre escavações meditativas?